domingo, 21 de agosto de 2011

NÃO O SUFICIENTE



           Ás vezes ele acordava pensando o que seria do seu dia, da sua semana, do seu mês, do seu ano... Então respirava profundamente e contemplava a manhã pela janela, escovava os dentes e decidia se o café seria muito saudável, leve ou reforçado com direito a algum tipo de doce.
            Naquele dia especialmente, sentia uma vontade de mandar embora algumas coisas que não existiam mais, ou que pelo menos pareciam não existir, mas, insistiam em fazer uma visitinha grega... Leu algumas palavras aleatórias de um dos muitos livros que tem e saiu: foi correr. E correu, transpirou muito, mas não o suficiente para lavar e transbordar o coração, a alma – Vale à pena lembrar que sentiu apertos na garganta enquanto observava os alongamentos em uma sala fria, sentiu vontade de entender os outros, os limites dos outros, talvez para poder entender os seus.
            Tomou banho e saiu, ia ser avaliado naquela tarde, mas somos avaliados todas as manhãs, tardes e noites, que diferença teria ou faria? Sentiu-se leigo e desprovido de um conhecimento que talvez pudesse ter desenvolvido e ou absorvido com mais esmero; caminhou pensando sobre isso e constatou que o conhecimento que tinha vinha da arte de observar e absorver vida, mundo...
            No dia anterior tinha tido problemas com um cartão de banco, “corriqueirices” do dia-a-dia que atrapalham o fluxo ou nos levam de volta a alguns lugares – como, por exemplo: as antigas moradas, os antigos porteiros, as antigas ruas... Antigas na visão dele, claro, pois elas fizeram parte de um cotidiano até redundante, eu diria, mas tinham um sabor de novidade nostálgica naquela tarde. Ah, o cartão? Ele terá que ir ao banco noutro dia; as correspondências foram devolvidas, afinal ele não mora mais em nenhum daqueles lugares.
            Acreditava, porém nas coincidências, nas coisas mágicas, inclusive no simples abrir de um portão para alguém que não conhecia, mas sabia da existência, sabe como?
            Porém o nó continuava apertando, fazia calor, transpirava, mas não o suficiente para lavar e transbordar o coração, a alma – Lavou o rosto e as mãos, entrou numa livraria e tentou encontrar um livro que dissesse alguma novidade aleatória... Acabou na seção de astrologia (o que não era grande novidade) e a previsão dizia:
-“Pessoas nascidas nesse dia são práticas na vida, enfrentam problemas com naturalidade, mas, tem dificuldade em se relacionar".
            Fechou o livro e resolveu ir embora. Comprou chá gelado e foi ao cinema, encontrou rostos conhecidos, interagiu, até com os estranhos – como era de costume. Que raio de dificuldade é essa afinal? Indagava a si mesmo. Não quis pensar, preferiu esperar, não atropelar.
            O filme era delicado, esperançoso, um pouco piegas talvez. Mas ele acreditava em pieguices e gostava delas na maioria das vezes, ele era um apaixonado. Emocionou-se, mas não chorou, apenas lacrimejou, mas não o suficiente para lavar e transbordar o coração e a alma.
            Dirigiu pela cidade e resolveu voltar para casa, à água caiu no corpo, estava feliz, introspectivo, e calado. Deitou e pensou nas possibilidades com otimismo. Adormeceu.

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